Lamentavelmente, os escândalos ocorridos nas igrejas vêm
confirmar nosso entendimento de que em muitos ambientes evangélicos, a
santidade de vida, a ética e a moralidade estão completamente desconectados da
vida cristã, dos cultos, dos milagres, da prosperidade em geral.
Uma análise do conceito bíblico de santidade destacaria uma
série de princípios cruciais, dos quais destaco alguns aqui:
1) A santidade não tem nada a ver com usos e costumes. Ser
santo não é guardar uma série de regras e normas concernentes ao vestuário e
tamanho do cabelo. Não é ser contra piercing, tatuagem, filmes da Disney. Não é
só ouvir música evangélica, nunca ir à praia ou ao campo de futebol. Não é
viver jejuando e orando, isolado dos outros, andar de paletó e gravata. Para
muitos, santidade está ligada a esse tipo de coisas. Duvido que estas coisas
funcionem. Elas não mortificam a inveja, a cobiça, a ganância, os pensamentos
impuros, a raiva, a incredulidade, o temor dos homens, a preguiça, a mentira.
Nenhuma dessas abstinências e regras conseguem, de fato, crucificar o velho
homem com seus feitos. Elas têm aparência de piedade, mas não tem poder algum
contra a carne. Foi o que Paulo tentou explicar aos colossenses, muito tempo
atrás: “Tais coisas, com efeito, têm aparência de sabedoria, como culto de si
mesmo, e de falsa humildade, e de rigor ascético; todavia, não têm valor algum
contra a sensualidade” (Colossenses 2.23).
2) A santidade existe sem manifestações carismáticas e as
manifestações carismáticas existem sem ela. Isso fica muito claro na primeira
carta de Paulo aos Coríntios. Provavelmente, a igreja de Corinto foi a igreja
onde os dons espirituais, especialmente línguas, profecias, curas, visões e
revelações, mais se manifestaram durante o período apostólico. Todavia, não
existe uma igreja onde houve uma maior falta de santidade do que aquela. Ali,
os seus membros estavam divididos por questões secundárias, havia a prática da
imoralidade, culto à personalidade, suspeitas, heresias e a mais completa falta
de amor e pureza, até mesmo na hora da celebração da Ceia do Senhor. Eles
pensavam que eram espirituais, mas Paulo os chama de carnais (1Coríntios
3.1-3). Não estou negando as manifestações espirituais. Creio que Deus é Deus.
Contudo, Ele mesmo nos mostra na Bíblia que manifestações espirituais podem
ocorrer até mesmo através de pessoas como Judas, que juntamente com os demais
apóstolos, curou enfermos e ressuscitou mortos (Mateus 10.1-8). No dia do
juízo, o Senhor Jesus irá expulsar de sua presença aqueles que praticam a
iniqüidade, mesmo que eles tenham expelido demônios e curado enfermos (Mateus
7.22-23).
3) A santidade implica principalmente na mortificação do
pecado que habita em nós e em viver de acordo com a vontade de Deus revelada
nas Escrituras. Apesar de regenerados e de possuirmos uma nova natureza, o
velho homem permanece em nós e carece de ser mortificado diariamente, pelo
poder do Espírito Santo. É necessário mais poder espiritual para dominar as
paixões carnais do que para expelir demônios. E, a julgar pelo que estamos
vendo, estamos muito longe de estar vivendo uma grande efusão do Espírito. Onde
as paixões carnais se manifestam, não há santidade, mesmo que a ortodoxia
doutrinária seja defendida ardorosamente, doentes sejam curados, línguas sejam
faladas e demônios sejam expulsos. A Bíblia não faz conexão direta entre
santidade e manifestações carismáticas e defesa da ortodoxia. Ao contrário, a Bíblia
nos adverte constantemente contra a ortodoxia dos fariseus, contra os falsos
profetas, Satanás e seus emissários, cujo sinal característico é a operação de
sinais e prodígios, ver Mateus 24.24; Marcos 13.22; 2Tessalonicenses 2.9;
Apocalipse 13.13; Apocalipse 16.14.
4) É mais difícil vencer o domínio de hábitos pecaminosos do
que quebrar maldições, libertar enfermos, e receber prosperidade. O poder da
ressurreição, contudo, triunfa sobre o pecado e sobre a morte. Quando “sabemos”
que fomos crucificados com Cristo (Romanos 6.6), nos “consideramos” mortos para
o pecado e vivos para Deus (Romanos 6.11), não permitimos que o pecado “reine”
sobre nós (Romanos 6.12) e nem nos “oferecemos” a ele como escravos (Romanos
6.13), experimentamos a vitória sobre o pecado (Romanos 6.14). Aleluia!
5) A santidade é progressiva. Ela não se obtém
instantaneamente, por meio de alguma intervenção sobrenatural. Deus nunca
prometeu que nos santificaria inteiramente e instantaneamente. Na verdade, os
apóstolos escreveram as cartas do Novo Testamento exatamente para instruir os
crentes no processo de santificação. Infelizmente, influenciados pelo
pensamento de João Wesley – que noutros pontos tem sido inspiração para minha
vida e de muitos outros –, alguns buscam a santificação instantânea, ou a
experiência do amor perfeito, esquecidos que a pureza de vida e a santidade de
coração são advindas de um processo diário, progressivo e incompleto aqui nesse
mundo.
6) A santificação é um processo irresistível na vida do
verdadeiro salvo. Deus escolheu um povo para que fosse santo. O alvo da escolha
de Deus é que sejamos santos e irrepreensíveis diante dele (Efésios 1.4). Deus
nos escolheu para a salvação mediante a santificação do Espírito
(2Tessalonicenses 2.13). Fomos predestinados para sermos conformes à imagem de
Jesus Cristo (Romanos 8.29). Muito embora o verdadeiro crente tropece, caia,
falhe miseravelmente, ele não permanecerá caído. Será levantado por força do
propósito de Deus, mediante o Espírito. Sua consciência não vai deixá-lo em
paz. Ele não conseguirá amar o pecado, viver no pecado, viver na prática do
pecado. Ele vai fazer como o filho pródigo, “Levantar-me-ei e irei ter com o
meu Pai, e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e diante de ti” (Lucas 15.18).
Ninguém que vive na prática do pecado, da corrupção, da imoralidade, da
impiedade, – e gosta disso – pode dizer que é salvo, filho de Deus, por mais
próspero que seja financeiramente, por mais milagres que tenha realizado e por
mais experiências sobrenaturais que tenha tido.
Precisamos de santidade! E como! E a começar em mim. Tenha
misericórdia, ó Deus!
Augustus Nicodemus Lopes
Fonte: http://tempora-mores.blogspot.com.br/
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